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consciência negra

Luiz Gama, poeta e jornalista

Negros no Brasil precisam de audácia, porque tudo é muro e violência.

Negros no Brasil precisam de audácia, porque tudo é muro e violência. Luiz Gama ensinou isso lá no século 19. Negro não pode ser advogado. Gama libertou centenas de escravizados. Proibido ser jornalista. Fundou e colaborou com jornais. Preto ser poeta já é demais? Gama publicou "Primeiras Trovas Burlescas". Essas facetas fustigaram as elites com sátira e denúncia, em seus textos, a coragem de recusar o destino que o Brasil insiste escrever aos filhos da escravidão.

Gama sabia que caminhava sobre as brasas da discriminação, que a reprovação dos brancos o cercava. E a denuncia: "Ciências e letras / Não são para ti / Pretinho da Costa/ Não é gente aqui (…) Desculpa, meu caro amigo / Eu nada te posso dar / Na terra que rege o branco / Nos privam té de pensar! (No álbum de meu amigo J. A. da Silva Sobral).

Mais um exemplo debochado de sua poesia: "Sei que é louco e que é pateta / Quem se mete a ser poeta". Bode era uma palavra usada para inferiorizar negros e Gama provoca: "Se negro sou, ou sou bode / Pouco importa / Bodes há de toda casta / Pois que a espécie é muito vasta". Mergulhar nas diferentes linguagens e lugares de sua obra, sempre voltada para a crítica e sátira social, é o trabalho de Ligia Fonseca Ferreira no artigo "Ethos, poética e política nos escritos de Luiz Gama", publicado na Revista Crioula, periódico dos Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Universidade de São Paulo (USP).

Poeta, jornalista, advogado, Luiz Gonzaga Pinto da Gama nasceu na Salvador de 1830 (já falamos um pouco sobre esse período em outro artigo). Tinha a revolta no sangue, filho de Luísa Mahin, a quituteira baiana que participou da Revolta dos Malês e da Sabinada. Segundo relatos, ela foi punida com a deportação para Angola. Não viu seu filho, que nasceu livre, ser vendido pelo pai, branco, aos 10 anos. Gama aprendeu a ler e escrever e conseguiu a própria liberdade aos 17. Prenúncio da vida futura nos tribunais. Como jornalista, fundou o Diabo Coxo, primeiro jornal humorístico ilustrado de São Paulo, o semanário Cabrião, O Polichinelo e colaborou com vários jornais.

Gama constriu suas palavras sob o peso do deslocamento que o racismo lhe impunha. No dilema entre opor-se às injustiças ou assimilar-se, tornar-se "um bom negro" letrado, ele escolhe ridicularizar e enfrentar os salões da elite, afirmando-se poeta afro-brasileiro.

Em "Primeiras Trovas Burlescas" (1859) – cujo poema mais célebre chama-se "Quem sou eu", também conhecido por Bodarrada – ele usa o pseudônimo Getulino. A palavra deriva de Getúlia, nome dado pelos romanos a áreas do litoral da Tunísia e da Argélia. Seu posicionamento não tem curva: é um autor de origem africana, que critica os mulatos que renegam ou desprezam suas ancestralidades. E celebra as festas e sua origem em "Lá vai o verso":

"Nem eu próprio à festança escaparei / Com foros de Africano fidalgote / Montado num Barão com ar de zote/ Ao rufo do tambor, e dos zabumbas / Ao som de mil aplausos retumbantes / Entre os netos da Ginga, meus parentes / Pulando de prazer e de contentes / Nas danças entrarei d'altas caiumbas "

No jornal Radical Paulistano publicou a coluna Foro da Capital a partir de julho de 1869. Era uma continuação, muito mais ácida, de seu trabalho como advogado. Criticando decisões e dando "lições de jurisprudência aos juízes paulistas (…) como advogado dos desvalidos, homens e mulheres pobres, livres ou escravos, vítimas espoliadas por juízes cuja conduta era uma afronta ao próprio Direito", diz o artigo. Termino com um trecho de um poema dedicado à classe:

"Mas eu sempre vigiando / Nessa súcia vou malhando / Dou de rijo no pedante / Não tolero o magistrado / Que do brio descuidado, / Vende a lei, trai a justiça".

Fonte: Metropoles

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