É difícil se manter em dia sobre as tolices ditas e publicadas no Brasil, seja na imprensa ou nas redes sociais. Na última delas, cheguei com bastante atraso, levando-se em conta a velocidade do mundo digital. Estou falando dessa história de "privatização das praias". Ela se espalhou por causa de um bate-boca entre estes dois portentos da inteligência nacional: Luana Piovani e Neymar.
Parece que a atriz ou ex-atriz atacou o jogador ou ex-jogador porque ele seria a favor de privatizar as praias e teve como resposta um monte de desaforos.
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De onde eles tiraram esse troço? De um projeto de lei já aprovado na Câmara e que agora é relatado no Senado por Flávio Bolsonaro. O PL propõe a venda da imensidão de terrenos da costa brasileira pertencentes à União. Eles estão na faixa de terra que começa 33 metros depois do ponto mais alto atingido pela maré.
Como esses terrenos não pertencem integralmente aos donos de imóveis localizados nessa faixa, eles precisam pagar uma taxa à União. O projeto de lei quer transferir a parte da União para proprietários privados já existentes, mediante pagamento, e também para estados e municípios, para a construção de moradias populares, no caso de o terreno ser terra de ninguém.
Quem defende o projeto diz que a União vai ganhar de imediato uma bolada com a venda e que vai faturar permanentemente com os impostos a ser pagos por investidores no ramo turístico com mais segurança jurídica para explorar as áreas adjacentes às praias. Além disso, os terrenos já ocupados por comunidades carentes serão transferidos de maneira gratuita para os pobres que lá vivem.
Quem ataca o projeto afirma que a União vai perder dinheiro ao longo do tempo, que a preservação ambiental do litoral vai para a cucuia de uma vez e que os proprietários privados vão fechar os acessos às praias — daí a conversa de que elas serão privatizadas.
Senhores, vou contar um segredo: as praias brasileiras já foram privatizadas há muito tempo, tanto pelos pobres como pelos ricos.
A quantidade de gente que vai ganhar a vida nas praias, com barracas disso e daquilo já representa uma privatização. O sujeito que liga o som alto com essas músicas esquisitas que brasileiros escutam também privatizou o espaço público. O pessoal do vôlei e do futebol, idem. O sujeito que fuma maconha ali do lado é outro que não está nem aí para o distinto público. O rico de condomínio à beira-mar que só dá acesso a pobre lá na ponta da praia age igualmente como se a praia fosse dele.
Parece que Neymar tem interesse no projeto porque está investindo em um grande projeto turístico para transformar 100 quilômetros do litoral nordestino no "Caribe brasileiro". Deixe eu rir e já volto.
Pronto, já ri. Sou um sujeito simplório, me perdoe, mas se Neymar tem algo a ganhar, eu sou contra por princípio. Não há racionalidade nisso, eu sei. Mas por que exigir racionalidade de mim quando se vive no país mais irracional do mundo?
Se Luana Piovani tivesse algo a ganhar pessoalmente, eu também seria contra. Sou suficientemente irracional para atender os dois lados. Ou todos os lados: por mim, as praias brasileiras deveriam ser fechadas a ricos e pobres. Com dinheiro e sem dinheiro, a gente só estraga a paisagem e degrada o ambiente. Vamos fechar as praias para todo mundo.
Fonte: Metropoles